Por Manoel do Santos NetoEscritor e Jornalista
Cedo demais para esquecer. Completam-se nesta segunda-feira (22) exatos 14 anos que aconteceu um crime hediondo em São Luís: a tortura e o assassinato do cantor e compositor Jeremias Pereira da Silva, o Gerô.
Muito jovem, ele tinha 46 anos de idade. Foi espancado até a morte por policiais militares, após assistir a uma sessão realizada no plenário da Assembleia Legislativa do Estado, que na época funcionava no Centro Histórico, na Rua do Egito.
Extraordinário personagem da cultura maranhense, Gerô se foi cedo demais. Vale lembrar: foi ele que criou as músicas de boa parte das campanhas eleitorais do saudoso ex-governador Jackson Lago e de outros políticos do Maranhão.
Filho de Pedro Correia da Silva e de Maria do Carmo Pereira da Silva, Gerô nasceu no município de Monção, no dia 6 de janeiro de 1961.
Cordelista, fã de João do Vale, Gerô foi parceiro de Joãozinho Ribeiro, de Escrete, de Josias Sobrinho, de Ribão da Flor, o Ribão de Olodum, hoje Ribão da Favela. Com seu inseparável chapéu de couro, Gerô gravou quatro CDs e diversos jingles de campanhas políticas e eleitorais.
Era o começo do Governo Jackson Lago. Gerô perdera o cargo de secretário de Cultura adjunto da Prefeitura de Vargem Grande. Estava desempregado e passando graves dificuldades – “Tô liso. Tô no pânico”, dizia ele -, embora tivesse sido o autor da famosa música que marcou a vitoriosa campanha do governador eleito em 2006. Em vão, ele procurava apoio de amigos no governo e no Poder Legislativo.
Era o começo da tarde de uma quinta-feira, 22 de março de 2007, quando Gerô acabou se envolvendo em uma confusão com seguranças da Assembleia Legislativa do Estado, policiais militares que trabalham à paisana. Era uma agitada quinta-feira na Casa de Manoel Beckman.
A galeria e o Plenário da Assembleia completamente lotados, em uma concorrida sessão solene. Mas o Gabinete Militar fora acionado sob a reclamação de que havia pessoas fazendo ‘baderna’ na galeria.
Após a sessão, Gerô começou a ser torturado nos porões do velho prédio da Assembleia e, em seguida, entre 12h30 e 13h, foi conduzido à viatura 028 do 9º Batalhão da Polícia Militar do Estado, ocupada pelos soldados Paulo Roberto Almeida Paiva e José Expedito Ribeiro de Farias.
Resultado: o inconformado preso, gritando que era amigo do governador do Estado e que não merecia ser tratado daquele jeito, acabou sendo massacrado - literalmente trucidado - pela polícia, ficando com todas as costelas fraturadas e grave hemorragia nos rins, de acordo com laudo expedido pelo Instituto Médico Legal (IML).
Mentira: Gerô não praticou assalto nenhum
Conduzido por uma viatura do 1º Distrito Policial, Gerô já estava morto ao dar entrada, por volta das 16h30, no Hospital Municipal Djalma Marques (Socorrão I). O caso abalou os meios políticos e rapidamente ganhou repercussão na imprensa. O governador Jackson Lago, que estava fora de São Luís, também teve um forte impacto, chegando a lembrar que Gerô compusera dois jingles para a sua campanha ao Governo do Estado.
Um movimento intenso durante a noite marcou a lavratura do flagrante contra os policiais acusados, que entrou pela madrugada. Para o Plantão Central da antiga Rffsa, na Beira-Mar, deslocaram-se vários políticos e auxiliares do governador Jackson Lago - dentre eles a secretária de Segurança Cidadã, Eurídice Vidigal, o secretário-chefe da Casa Civil, Aderson Lago, o secretário da Igualdade Racial, João Francisco, o comandante geral da Polícia Militar, coronel Pinheiro Filho, e o delegado geral da Polícia Civil, Jeferson Portela – que fizeram questão de acompanhar de perto o desenrolar dos fatos.
Depois do ocorrido, os PMs envolvidos na tortura e morte do artista alegaram, em sua defesa, que não sabiam quem era Gerô. E ainda inventaram uma mentira absurda: que Gerô praticara assalto contra uma mulher, na cabeceira da Ponte São Francisco.
No Maranhão, o dia 22 de março é o Dia Estadual de Combate à Tortura. A data foi instituída através da Lei nº 8.641/2007, em razão deste trágico episódio que culminou com a morte de Gerô.